10 de Novembro de 2023
PsicoBio: multidisciplinaridade é base para o Programa de Pós-graduação em Psicobiologia na UFRN
[0] Comentários | Deixe seu comentário.Naomi Lamarck – Sala de Ciência – Agecom/UFRN
Especial Pós-Graduação – Como conciliar os estudos da mente e comportamento humanos às questões de saúde pública, de meio ambiente e de qualidade de vida? Os estudos realizados no Programa de Pós-graduação em Psicobiologia (PsicoBio) da UFRN respondem essa pergunta em várias frentes. Há 38 anos, o Programa, primeiro da região Nordeste na psicobiologia, forma mestres e doutores em duas áreas de concentração: Estudos do comportamento e Psicologia fisiológica. Desde 2010, é reconhecido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) com conceito 6, que o caracteriza como Programa de Excelência Acadêmica.
O caráter multidisciplinar marca uma presença importante em todos os campos de pesquisa no Programa. Atualmente, são 23 docentes de diferentes áreas e formações. Somente em 2022, foram publicados, a partir do Programa, 74 artigos, entre jornais, revistas ou periódicos. Além disso, 13 pesquisas foram publicadas em livros e 13 em anais de eventos. As publicações do Programa contemplam trabalhos em todas as suas linhas de pesquisa, que são: Abordagem evolutiva do comportamento humano; Análise comportamental e cognição animal, comunicação animal e ecologia sensorial; Comportamento social e ecologia; Endocrinologia comportamental; Psicobiologia dos processos cognitivos; Psicofarmacologia; e Ritmos biológicos.
Um exemplo de como esse trabalho busca abarcar diversas áreas do conhecimento está na pesquisa Impact of ocean warming on a coral reef fish learning and memory – Impacto do aquecimento dos oceanos na aprendizagem e memória de peixes de recifes de coral, em tradução livre –, que aponta, de forma pioneira, como as altas temperaturas do oceano global podem causar perda de memória nos peixes de recife e até mesmo torná-los incapazes de aprender. A pesquisa virou, inclusive, reportagem no New York Times, um dos maiores veículos de comunicação do mundo.
Como a água mais quente contém menos gás dissolvido, as temperaturas mais altas podem fazer com que os níveis de oxigênio na água caiam e, assim como os humanos, os peixes não conseguem funcionar normalmente com essa falta. “A capacidade cognitiva dos peixes e a tomada de decisões no ambiente natural são muito importantes para sua sobrevivência, é algo que todos têm que fazer todos os dias. Se você decidir errado, estará exposto ao risco”, explica Ana Carolina Luchiari, professora do Departamento de Fisiologia e Comportamento (DFS) da UFRN e uma das autoras do estudo.
Os resultados destacam a necessidade de uma investigação mais ampla sobre como o calor afeta a cognição dos peixes em diferentes espécies, tanto predadores como presas, com potencial para mudanças em cascata nos ecossistemas. Como as mudanças de temperatura de diferentes durações e magnitudes afetam a memória dos peixes, permanece uma importante questão em aberto, mas o que reforça Luchiari é que, para o caso dos peixes tropicais, “estamos colocando-os numa situação muito perigosa”, ressalta Ana.
Outro exemplo está no Laboratório de Medidas Hormonais, coordenado pela professora Nicole Galvão-Coelho, também do DFS. O Laboratório atua numa linha de pesquisa de fronteira, buscando biomarcadores moleculares que possam auxiliar na prática clínica da psiquiatria, especificamente nos transtornos de humor. Para isso, conta com duas grandes linhas de tratamentos: uma de intervenções baseadas no estilo de vida e outra com utilização de substâncias psicodélicas, como a ayahuasca, o DMT e a cetamina.
As pesquisas com os psicodélicos desenvolvidas por esse grupo, em colaboração com o Instituto do Cérebro (ICe) da UFRN, são de grande impacto nacional e internacional. Até o momento, foram publicados artigos científicos demonstrando a eficácia da ayahuasca, tanto na resposta clínica quanto nos biomarcadores da depressão. A literatura produzida contou com elevado número de citações científicas e divulgação na mídia nacional, em veículos como o Fantástico, a Folha de São Paulo e o Correio Braziliense, e na mídia internacional, no Washington Post, Stuff New Zealand e The Sunday Star-Time.
No momento, o grupo está realizando estudos clínicos com a cetamina subcutânea e o DMT isolado, com o objetivo de tornar essas intervenções menos dispendiosas e mais rápidas, a fim de facilitar sua implantação na prática clínica.
São também uma das grandes bases para o PPGPsico a cidadania e a qualidade de vida. Destaca-se, por exemplo, o Estudo do Ciclo Sono e Vigília em pessoas com deficiência visual (cegueira total), que tem como foco a análise da ritmicidade circadiana e do comportamento alimentar por meio de sensores de medida contínua da glicemia. Esse é um estudo pioneiro, sendo o primeiro dessa temática realizado fora do hemisfério norte. Já a pesquisa Por que gostamos de pedalar?, do professor John Fontenele Araújo (DFS), relaciona o ato de pedalar uma bicicleta à ativação das vias dopaminérgicas e, consequentemente, mudanças no estado de humor, um efeito que os pesquisadores apontam ser semelhante ao provocado por medicamentos antidepressivos.
É também ponto de interesse dos pesquisadores do Programa entender o comportamento de animais (humanos e não humanos) por meio de mecanismos, de funções e da evolução dos comportamentos. A partir da evolução social, pesquisas investigam vários aspectos da vida social, como as interações entre os indivíduos de um grupo que estabelecem relações hierárquicas. Esses comportamentos têm consequências sobre a reprodução, o cuidado parental e os processos de tolerância social, formas de comunicação ligadas diretamente às interações sociais e aos processos cognitivos que permeiam as interações sociais e com o meio físico.
O coordenador do PPG PsicoBio, Felipe Nalon Castro, considera que o Programa se destaca por sua inovação e produção intelectual voltada para o público externo à UFRN e comunidade acadêmica. Para o docente, os pontos fortes que mantêm um bom nível do Programa incluem a boa formação, a produção de qualidade e a divulgação científica.
“É um programa maduro, inserido na área de avaliação da Psicologia, que apresenta uma proposta consistente, colaborações com diversas instituições de ensino superior e universidades internacionais. Uma grande oportunidade que temos para avançar é no campo da internacionalização. Ampliar a atuação internacional do programa e estabelecer colaborações com instituições e docentes de outros países pode enriquecer ainda mais a formação dos nossos discentes e reforçar a produção. A expectativa é abrir caminho para obtermos uma avaliação nota 7 no futuro próximo”, afirma.
O coordenador destaca, ainda, eventos oferecidos pelos professores que atuam no programa, como o Simpósio da Psicobiologia, que ocorre anualmente, e diversos outros que aproximam a sociedade dos projetos desenvolvidos dentro da Universidade, como o Tem peixe na praça, o Neuroensina e o Crono na escola. Estão ainda em desenvolvimento propostas de oficinas sobre o sono e auxílio para tratamento de pessoas com problemas de saúde mental.